BEJANI

MAGELA: Naquela época, quando eu entrei na campanha dele, eu não entrei na campanha de um candidato a prefeito, eu entrei na campanha de um amigo que eu coloquei no rádio.
Eu era diretor da Rádio Industrial e a Vera Cury, jornalista, uma pessoa agradabilíssima, muito boa, trabalhava comigo na rádio. Me pediu que o primo dela precisava trabalhar, que ele era radialista, que tinha trabalhado numa rádio em Barbacena, não sei o quê… E ela todo dia falava aquilo comigo. Até que um dia eu falei: Manda o seu primo vir aqui. Aí ele foi. Lá eu conversei com ele e ele se dispôs a trabalhar o período de um mês para ser testado. Eu não sei se ela lembra disso, mas uma pessoa que eu admiro muito como jornalista, como pessoa: Regina Gaio. Essa Regina é uma pessoa fantástica, maravilhosa, minha amiga, gosto muito dela muito, muito, muito. Ela estava cuidando da parte de jornalismo da Rádio Industrial. Aí eu falei com ela:
MAGELA: -Esse rapaz vai ficar com você, você experimenta ele. Passado umas duas semanas ela me chamou e falou:
REGINA GAIO: -Esse rapaz não cumpre pauta, ele sai para rua e faz o que ele quer.
MAGELA: -E as matérias que ele traz, você aproveita alguma?
REGINA GAIO: -Aproveito.
MAGELA: -Elas são boas?
REGINA GAIO: -Algumas sim, outras não. Mas ele é meio abusado, ele é muito atirado, ele até corajoso.
MAGELA: -Vamos experimentar mais um pouco .
E nisso ele foi ficando e foi adquirindo experiência. Mais tarde, eu o coloquei no futebol fazendo reportagem de campo, e ele foi com a sua impetuosidade, que era o que a Regina tinha falado comigo e achava que ele era muito ativo, muito impetuoso, muito corajoso, ele foi conquistando o povo de Juiz de Fora. Porque ele ia de manhã cedo para o INSS:
-O médico não chegou.
-Que hora que ele marcou?
-Marcou para 7 horas, são 9 horas e ele ainda não chegou.
Aí peitava o médico… Então ele foi ganhando prestígio junto ao povo e nós trabalhando junto. Eu como comentarista, ele como repórter e o Ivan Costa, outra grande figura, baita narrador, está até hoje trabalhando, né? E ele foi ganhando força e conquistando o povo, até que ele… Acabou a Rádio Industrial, nós fomos para a Capital, da Capital ele saiu, foi para a Nova Cidade. Na época era do Josino Aragão. Mello Reis, Josino Aragão… Era um grupo. Mas quem mandava na rádio era o Domingos Frias, entende tudo de rádio, gente do melhor nível. E o Domingos Frias fez a Rádio Nova Cidade ser a mais ouvida naquela ocasião. O departamento de esportes então era uma parada! Silva Júnior narrando, Alberto Bejani, Fernando Luiz reportando e Geraldo Magela comentando… Ah, não tinha para ninguém. Zé Eduardo Araújo também trabalhou nessa rádio, muito bom comentarista, excelente comentarista e um político muito sério, muito de bem. E o Bejani… Nessa altura a Rádio Nova Cidade lançou um furgão que falava com o povo na rua, aí que o Bejani deitou e rolou, né? Até que ele um dia… Eu estava treinando o Sport Clube Juiz de Fora, 1987, ele me procura e fala comigo que era candidato a prefeito. Eu sempre falava: você deve ser candidato a vereador. Porque o casamento dele foi uma multidão dentro e fora da igreja Catedral. Eu nunca vi tanta gente, nem sexta-feira da Paixão. Tinha gente… Multidão! Aquilo eu falei: Se candidatar, tá eleito! Aí ele veio falar comigo que era candidato a prefeito! Aí eu estou até lá no Sport:
– Disputa Vereador, rapaz…
– Não! Vereadora é a minha mulher, vereadora é a Márcia!
Foi prefeito! Dificuldade, dinheiro, sociedade não investia porque não acreditava muito, mas ele acreditava, nós que estávamos na campanha sentíamos a pressão de público dentro das campanhas. Teve um comício que o Mello Reis fez com Chitãozinho e Xororó em Benfica e ele fez com o Forró da Perereca em Bernardino. Tinha mais gente do que no Chitãozinho e Xororó. E acabou ganhando a eleição! No primeiro dia de apuração, ele estava em terceiro lugar. Eu estava comandando… Eu fui chamado pelo Alberto Lavinas, que era diretor da Rádio Manchester, para montar um esquema para cobertura das eleições. Então eu levei o Wilson Cid, José Carlos de Lery Guimarães e alguns alunos. Sérgio Rodrigues. Bom ele, né? Muito bom. Foi lançado por mim no rádio. E o irmão dele (Gil Horta). Fizemos uma baita de uma cobertura. Uma semana cobrindo. E a noite nós tínhamos um debate: Wilson Cid, Zé Carlos, eu e um convidado. Na terça-feira da semana da eleição, que é após a eleição. Eleição domingo… terça, o Bejani foi lá no programa. Chegou no programa, ele falou: Eu tô eleito! Ele estava em terceiro ou quarto lugar. E a pesquisa da Tribuna tinha dado em manchete, pode percorrer os arquivos que você vai ver aí, “Mello Reis é favorito”. Não era nada, aquilo foi uma tentativa de jogar o Mello para cima. Aí o Bejani falou: Vou ganhar aqui, aqui, ali… E ganhou em todos os lugares que ele apontou. Porque a gente sabia aonde que ele… Era na população mais carente, o povo mais sofrido. E a classe média o rejeitava. Ele sabia!
FLÁVIO: Magela, e esse programa que ele fazia era em qual rádio mesmo?
MAGELA: Rádio Manchester! Nós demos apoio. Geraldo Mendes deu muito apoio, muito! Da sociedade foi o Geraldo Mendes. José Eduardo Araújo também ajudou, deu apoio, não foi muito de ir em comício, assim, de falar em comício, mas deu apoio. O Oscar Surerus na época, ele não tinha esses envolvimentos que teve depois. No mais, era tudo pé de chinelo.
MAGELA: Bejani eleito. Vai fazer uma passeata, você precisa de ver a quantidade de carros que estavam no Bandeirantes, a classe média estava oferecendo tudo, tudo interesseira! Você precisa ver a quantidade… Na campanha ele não tinha carro às vezes para se deslocar de um bairro para o outro. Quando foi eleito, você tinha que ver a multidão de carros que estava lá… Caminhão, carro, tudo. Gente oferecendo casa, fazenda para ele ir para lá… Interesseiros, né?! Pode falar isso, interesseiros! Classe média interesseira! E alguns até de classe alta. Como é que fez? Fez uma viagenzinha lá para o Espírito Santo e voltou. Vai fazer o secretariado. E agora?
Uma noite, depois da eleição, é claro, ele chega na minha casa, no portão da casa, aqui, por volta de duas horas da manhã, estava chovendo, uma noite feia, escura, com uma pasta na mão e a Márcia. Abri a porta, ele entrou e falou comigo:
– Fulano me ofereceu, o fulano era uma figura conhecidíssima em Juiz de Fora, milionário, me ofereceu a fazenda dele, mas é aquilo lá é para fazer filme de terror. E o telefone não para de tocar e ele querendo indicar para fazer nomes para formar secretariado. E eu não vou lá mais não. Aí eu falei:
-Dorme. Amanhã a gente resolve isso.
Aí eu falei com ele:
-Olha, você precisa formar um secretariado bom, um secretariado à altura. Porque a cidade confiou em você, mas você não teve a maioria, a maioria está do outro lado, está contra você. A maioria votou no José de Castro Ferreira, votou no Jorge Lima, votou no Custódio, votou no Murilo Hingel. Então você tem que fazer um grande governo, um governo austero e com pessoas competentes.
Aí foi que surgiu, eu que indiquei… Fica engraçado eu ficar falando eu, né? Tratando na primeira pessoa. Não é assim.
FLÁVIO: Não tem nada a ver.
MAGELA: É muita pretensão.
FLÁVIO: Não é não.
MAGELA: Aí, procuramos o Juracy Neves, do jornal. Nós procuramos. Eu falei com ele, ele se propôs a ir a Belo Horizonte com o Bejani eleito, pra conversar com o governador e conseguir um adiantamento de receita pra que ele pudesse pagar os salários de dezembro. Porque o dezembro você só paga nos primeiros dias de janeiro, no quinto dia útil do mês seguinte.
FLÁVIO: Então o Bejani pegou uma prefeitura que estava ruim das pernas?
MAGELA: O salário não tinha pago. Dezembro estava sem receber. Mas aí conversei com o Juracy. Aí nós resolvemos: vamos fazer o secretariado pra ele. Vamos indicar pra ele os nomes e ele escolhe, a gente indica três e ele escolhe um dos três. Ninguém impôs nomes.
Aí formou-se esse governo, que foi constituído de muitas pessoas sérias, muito boas. E fez um governo, até então considerado um bom governo. Depois veio a campanha… Não tinha reeleição naquela época. Depois veio a campanha para deputado estadual. A mulher dele foi eleita vereadora. Nssa época que ele foi eleito prefeito, pelo PJ (Partido da Juventude). Aí, ele foi deputado estadual. Foi eleito deputado estadual, fez um mandato bom. Mais tarde volta a candidatura a Prefeito, perde. No estadual ele foi duas vezes, depois perde para prefeito, depois ganha outra vez para prefeito.
Como sempre, eu não reivindiquei cargo nenhum. Não reivindiquei no governo do Itamar, não reivindiquei no do Augustinho, não reivindiquei no do Saulo, o Saulo deu porque quis. No último dia de anúncio do secretariado, ele me anunciou superintendente da AMAC, fiquei um ano.
FLÁVIO: Por que só um ano?
MAGELA: Porque eu fui para a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico.
FLÁVIO: Você acha que as coisas ainda estavam tranquilas?
MAGELA: Não! Estava com muito problema! Muitos problemas… Tanto que ele teve que fazer as mudanças. Teve que mudar o IPPLAN, teve que mudar a tesouraria. Para o IPPLAN foi o meu irmão: Dr. Adelson Jesus Tavares. O secretário de finanças da fazenda era o de Brasília, que veio pra aqui, indicado não sei por quem. Aí ele tirou ele. E no final, nos últimos três meses, eu tive que acumular a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e a Secretaria de Governo. Foi quando acertamos tudo, e ele querendo entregar um governo organizado, pronto pro Custódio. E o Custódio ganhou e foi o prefeito de Juiz de Fora.
FLÁVIO: O que você me diz da Rosa Mística?
MAGELA: Fé eu não posso falar, porque que a gente não está dentro do cara e não sabe no que ele acredita. Mas era um grande marketing. Foi um grande marketing.
FLÁVIO: Surgiu depois da eleição?
MAGELA: Antes!
FLÁVIO: Na rádio já tinha?
MAGELA: Não. Depois. A Rosa Mística surgiu praticamente por necessidade de sobrevivência. Mandava fazer e vendia nessas festas religiosas, nessas quermesses religiosas como Ouro Preto, Congonhas e por aí… E a Rosa Mística foi um marco, né?! Eu só não posso entender como é que uma pessoa tem uma fé incrível na Rosa Mística e depois entra para uma religião que não acredita em Nossa Senhora. Então não é qualquer um que… Precisa ter uma estrutura familiar muito forte para poder não se deslumbrar, não é? Porque a própria sociedade acaba levando o cara ao deslumbramento. A própria sociedade leva o cidadão às vezes a praticar coisas que ele, às vezes, nunca tinha intencionado fazer. Quando o cidadão é cooptado para fornecer alguma coisa e o cidadão que vai cooptá-lo oferece em troca algum dinheiro? Ele vai dizer não, eu não preciso disso, eu não aceito isso… Pode fazer isso! Mas é que são tantas as vezes que o cara é aporrinhado para receber dinheiro, que ele uma hora fala: Isso não tá errado não, tem tanta gente querendo me dar dinheiro! E aí vai desvirtuando o caráter da pessoa, não é? Aí, de repente o cara acha que ele é: O mais forte, o mais poderoso e o mais rico!
FLÁVIO: Você recebeu muitas propostas tentadoras?
MAGELA: Recebi várias! Não tem ninguém nessa face da terra que pode dizer que eu aceitei alguma! Não tem ninguém na face dessa terra que pode dizer que eu aceitei um centavo que não fosse do meu salário! Ninguém! Porque nunca recebi! Dois cidadãos que levaram o prefeito a essa ruína que ele teve ainda recentemente, me ofereceram um carro novo! Acharam que eu como secretário de governo não podia ter um carrinho velho como eu tinha! Eu falei:
– É o que eu pude comprar com meu dinheiro.
Eu não aceitava favores pra não ficar devendo favores! Pode ser até que eu tenha me tornado antipático. Depois no final já pouca gente se aproximava de mim para pedir as coisas, porque sabia que comigo não tinha jeito, não adiantava. Então essa foi a outra passagem minha. Não participei de nenhum tipo de maracutaia em governo nenhum! Nada!
MAGELA: O Bejani sempre foi atirado! Sempre teve coragem! Como ele não tinha apoio de políticos em Juiz de Fora, o único político em Juiz de Fora que deu apoio a ele foi o Geraldo Mendes e o Oscar Surerus, que tinha sido candidato a vereador. Ele foi a Alagoas, se apresentou ao Collor, como radialista em Juiz de Fora e como candidato a prefeito, candidato do PJ, e o Collor, que também não tinha muita coisa em Juiz de Fora, tratou logo de adotar o Bejani como afilhado político dele, e o Bejani acabou tendo o apoio do Collor e o Collor acabou ajudando Bejani. Deu declarações e tal… Bejani eleito, o Collor depois candidato à presidente, 2 anos depois, o Collor pretendia que a candidata dele a vice seria a Márcia Kubitschek. A Márcia não quis. Aí ele pretendia que fosse o Newton Cardoso, o Newton Cardoso também não quis. Porque ele queria um nome de Minas Gerais. Foi quando o Bejani indicou o Itamar. Eu tenho foto do Itamar indo na prefeitura, no governo do Bejani, para assinar a ficha de filiação ao PRN. E foi assim: o Bejani indicou Itamar para ser vice do Collor. O Bejani já era prefeito. O Itamar depois… O Collor veio a Minas Gerais e acabou tendo contato com o Itamar e indicando o Itamar para vice-presidente da República. Quem fez a ponte entre Itamar e Bejani foi o Geraldo Mendes, rigorosamente Geraldo Mendes!
A única coisa que eu lamento muito na política Juiz de Fora é ausência de um líder. Quem é líder político em Juiz de Fora? Quem bate no peito e grita que é ouvido pelos homens que mandam nesse país? Quem pega um avião daqui, vai a Brasília e diz: Eu vou lá reivindicar isso pra Juiz de Fora. Quem? Ninguém!
O próprio Itamar, quando foi presidente da república, disse que não fez mais por Juiz de Fora porque ele ia ser chamado de, que ele estava protegendo os mineiros de Juiz de Fora. Isso é lamentável! Você pega um paulista ele bate no peito… Você pega agora o Rio de Janeiro… Você vê como é que eles estão defendendo o Rio de Janeiro, não só porque ele vai sediar Copa do Mundo e vai sediar Olimpíada. Você vê como é que os homens do Norte e Nordeste… O neto do Miguel Arraes já está se projetando pra ser um futuro presidente da república, não é? Juiz de Fora acidentalmente teve um presidente da república. Porque foi acidental. A eleição do Itamar a presidente da república foi acidente, com o afastamento do Collor! Quando é que se afastou um presidente no Brasil por corrupção? Nunca!