MAGELA: Mas o Airton Moreira era irmão do Zezé Moreira, que foi técnico da seleção brasileira. Era irmão do Aimoré Moreira que foi campeão do mundo com o Brasil em 62. Eles eram de uma família de grandes… O Airton Moreira formou aquela base daquele timaço do cruzeiro que encantou Brasil: De Tostão, Piazza… E o Airton queria um time para treinar com o Tupi. O Tupi folgava no campeonato, e ele queria um time. Falaram com ele para levar o Nacional do Ladeira. Por que que o Nacional? Um time de garotos, que jogava a bola, que tocava a bola, que tinha como preocupação jogar futebol como distração e não ganhar a qualquer custo como hoje a gente vê agora nego matando o outro de porrada. Vamos lá com o Tupi.
Chegando lá ele me chamou e falou: Ó, o goleiro do Tupi vai jogar no gol do seu time e o goleiro do seu time vai jogar no gol do Tupi.
Por que que ele falou isso? Porque ele achava que o Tupi ia massacrar o Nacional, que ia muito mais bola no gol do Nacional e o goleiro do Tupi que era o Totti ia ser mais empenhado, e ele ia treinar mais. Eu falei: Você que sabe! O que aconteceu? O Nacional joga e dá um show de bola, porque o Nacional jogou e o Tupi treinou. Tem que considerar isso, mas ele é muito observador também, acabou o treino ele me chamou e falou comigo: Gostei do seu time!
Eu falei: Meu time marca por zona, não fica correndo atrás de jogador o campo inteiro, quem cai na zona tá marcado. Ele falou: Achei ótimo seu time. Você treina muito!
Eu falei: Eu treino muito nos pauzinhos.
Fui ensinando e mostrando como é que eu usava. Eu usava “tampilinha” de refrigerante e cerveja pra mostrar pro jogador como é que ele fazia.
Aí ele pede pra treinar de novo. Eu falei com ele que não, porque os jogadores estudavam, tinha 17 anos. Aí ficou pra outra semana. Vamos nós lá e ganhamos de 1 a 0. Meio de semana. Os jogadores do Nacional alguns faltaram a aula alguns deles e foram lá.
Aí eu comecei a minha via crucis como treinador. Ele me chama pra ser auxiliar dele, mas eu vou ser auxiliar do Airton. Mas antes eu já tinha entrado no Tupi. Vou contar um detalhezinho.
Eu servia no exército na 12CR, hoje é décimo antigamente era 12. 12 RI, 12 CR. E tabalhava comigo o Sargento Erédia, ou trabalhava como ele, eu era soldado ele era Sargento. E ele era o técnico do juvenil do Tupi. E o Juvenil do Tupi não ganhou de ninguém. Sport,Tupynambás… E vem o último jogo, Tupi e Tupynambás, porque jogaram as três categorias no mesmo dia. Juvenil de manhã, aspirante nas preliminares dos profissionais e os profissionais. Era o chamado: Calça, colete e paletó! Quando você ganhava os três você falava que ganhou calça colete e paletó. Na rua era uma gozação: Calça, colete e Paletó.
E vai jogar Tupi e Tupynambás Calça, Colete e Paletó. Eu já era treinador do juvenil do Bonsucesso, não tinha Nacional ainda, 1947.
O Sargento Erédia e falou comigo:
– Eu não vou dirigir o Tupi domingo contra o Tupynambás não, leva o time pra mim.
– Mas como? Ninguém me conhece!
Pra mim era uma glória! Mas como eu vou …
– Chega lá e fala com eles lá que eu estou viajando, que eu fui para o Espírito Santo , e que você vai levar o time pra mim.
Ele tava com medo de levar uma chacoalhada grande e tava com medo de dirigir.
Aí eu vou a sede do Tupi, na Galeira Pio X, lá em cima, sobe uma escada Helicoidal e vai lá em cima. Seu Tofi Ahouagi, presidente ou diretor de esportes… Sei que ele era um homem forte no clube. Ou era o Áureo Carneiro… Era um dos dois… Os dois mandavam! Seu Áureo Carneiro que era avô do atual presidente do Tupi… E Falei com eles e contei a história.
– Não, você é um menino! Você não pode dirigir juvenil! Como é que o Sargento faz isso com a gente?
– Eu to aí!
Não tem outro caminho, encaminhado está!
Aí pedi pra ele a ficha dos jogadores, ninguém queria ir. Eu peguei a maioria dos jogadores do Bonsucesso, na sede inscrevi na liga e levei o time pra jogar contra o Tupynambás pelo Tupi.
O Campo? Lotado!
FLÁVIO: Mas eram os meninos do Bonsucesso?
MAGELA: Do Bonsucesso! Uns 3 ou 4 do Tupi foram também. E eu levei os meninos do Bonsucesso, alguns nomes eu lembro: Gonzaga, Cazuza, Denone, Joãozinho Romano, Paulinho, Peracinho.
Metemos ferro no Tupynambás de 3 a 0. Se o Tupynambás empatasse ele era campeão, se perdesse era o Sport. Tiramos o título deles.
Aí o que aconteceu? Acabou o ano e eu não quis mais… Ou eu não quis ou eles não me quiseram. Eu sei que eu só fui voltar pro Tupi em 54 com o Airton Moreira, já dirigindo o Nacional. E aí voltando ao Airton no Tupi, me convidou pra ser auxiliar dele, eu fui.
Trabalhava muito, treinava goleiro…
FLÁVIO: Nessa época você tava só no futebol ou você trabalhava em outro lugar? Como auxiliar técnico você tinha renda alguma coisa?
MAGELA: Ele que me pagava do bolso dele!
FLÁVIO: Mas era muito pouco né?
MAGELA: Me dava uma ajuda.
FLÁVIO: Mas tinha outro trabalho ou não?
MAGELA: Trabalhava com meu pai, na casa de calçados dele. Ele ficava danado que eu saia de lá porque tinha que treinar o Tupi.
Aí o Airton me ensinando, eu aprendendo, olhando. Ele muito educado, uma pessoa fantástica. Eu tenho um retrato com ele, vou passar pra você.
E aí fomos campeões. Aí eu fiquei no ano seguinte 55. Quando foi no final de 55 o Airton foi embora. Perdemos o campeonato. E eu assumi o Tupi em 56. Eu tinha 29 anos. Tinha idade pra jogar, mas eu já não jogava mais, nem futebol pra jogar no Tupi eu tinha. Nem sei também se eu tinha competência pra ser o treinador dos profissionais. Por quê? Porque eu vinha de auxiliar do Airton, inexperiente. Os meus primeiros dias foram ruins como treinador. Porque Mateuziho, Totti… A grande maioria deles me via um garoto, não respeitavam muito, mas eu impus. Cheguei a usar até pá pra dar porrada neles! E consegui contar e ficar no Tupi. Fizemos uma belíssima campanha em 56. Fomos campeões.
FLÁVIO: Você era auxiliar técnico?
MAGELA: Não, eu já era o treinador.
FLÁVIO: Por que o outro saiu?
MAGELA: Ele foi embora para o Cruzeiro.
FLÁVIO: Em 55?
MAGELA: 55 ele ficou ainda, em 56 ele foi para o Cruzeiro. E eu assumi o Tupi! Foi onde eu comecei a dirigir futebol profissional. Mas o Tupi me deixou ficar não foi porcompetência minha não, é porque não tinha outro. Como não tinha outro, fica esse mesmo e vai tocando até ter condição de contratar um treinador de nome, e eu acabei ficando.
E fui bem! juvenil muito bem, aspirantes muito bem, grandes revelações naquela época.
E eu vou jogar contra o Social Olímpico Ferroviário de Santos Dumont no estado de Sales Oliveira. Tava na frente do campeonato.
Fizemos 3 a 0 no Social, no final do jogo houve um corner contra o Tupi, e o Arinos que jogou no América do Rio, um Belo jogador, do Social, bateu um corner do lado esquerdo com o pé direito, a bola fez uma curva e entrou no ângulo do Totti. 3 a 1 para o Tupi. Ganhamos o jogo, mas antes do jogo eu tive um problema com um jogador que chegou bêbado e eu não botei para jogar. Ele era um dos craques do time. E houve uma confusão que todo mundo queria que eu pusesse ele assim mesmo eu não pus. Fora! Passou a noite na gandaia…
E o Tupi ganha de 3 a 1. Ótimo! Continuou invicto, continuou na frente, mas o diretor do Tupi o Adão Acauí, que eu tinha verdadeira adoração, me interpelou porque esse jogador não jogou. Eu falei: Cê tá cansado de saber que ele chegou bêbado, não tenho que te dar satisfação… E acabamos brigando! Sai no tapa mesmo.
Seu Toufi, me chamou no outro dia, na segunda-feira, na loja dele na Rua Marechal Deodoro. Ele tinha uma loja de tecidos e falou:
– Você vai ter que se afastar, porque o Tupi vai fazer nós vamos fazer uma sindicância para ver quem tem razão.
– É claro que quem tem a razão é ele, pois é ele quem põe dinheiro no clube. Eu tô fora!
Mas aquilo me magoou muito, porque eu que eu é que fui vítima, ele me deu um chute na canela. Eu fui vítima e eu revidei. E aquilo me deixou muito magoado. E falei: Ainda vou voltar a jogar contra esse Tupi. Vou contrariar meu coração e vou jogar.
FLÁVIO: Você já gostava antes, mas aí você começou a se envolver!
MAGELA: Mas aí quando eu tô lá dentro eu estou empolgado com a função que eu estou exercendo. A imprensa me dava muita força. O Arides Braga que escrevia no diário da tarde me elogiava muito, o Mário Heleno me elogiava muito, todo mundo me destacava. E eu tava empolgado com aquilo, 54. Não tinha casado ainda era solteiro. Aí o Airton me indica para ir para o Fluminense trabalhar com o irmão dele Zezé Moreira. Ali começava eu abrir caminho a nível de Brasil, porque se tá no Fluminense vai embora pra outros clubes. Eu to lá, mal cheguei, o Zezé tava muito satisfeito comigo, por causa das informações do Airton. Eu venho a Juiz de Fora depois que o Fluminense ganhou de 3 a 1 do Madureira, num sábado.
Aí eu vou na liga, pra encontrar com os desportistas lá, chego lá encontro com o Isaías Bagno, que foi técnico do Sport e do Tupi também. Ele é pai do Marco Aurélio Bagno e do Marco Antônio Bagno da TVE, que por sinal é uma figura doce maravilhosa e que jogou muito bola também, um craque. Aí eu vim embora, e o Isaías disse: Eu não quero ir pro Olympic não, o Olympic está buscando um treinador.
Quando eu chego em casa… Eu morava na rua Américo Luz, 362, aqui no Manoel Honório.
FLÁVIO: Mas você continuava no Fluminense?
MAGELA: Continuava, mas vinha aqui. Aí chega o diretor do Olympic: Orfeu Bonato, Doutor Moacir Barra… Me convidaram pra ir pro Olympic. Eu não sabia se o Olympic tinha estrutura, não sabia que o Olympic era lanterna do campeonato… Não tinha nada.
FLÁVIO: De onde era o Olympic?
MAGELA: Barbacena. Disputava o campeonato profissional regional em Juiz de Fora.
Aí eu falei:
– Ai meu Deus, é agora! O que vocês tão me oferecendo?
– Te damos isso e isso…
Nem me lembro quanto.
– Mas eu quero um dinheirinho aqui na mão.
– Toma!
Vou eu pro Olympic. Antes eu vou no Rio e falo com o Zezé. Que não ia ficar lá.
“Não faz isso, você tá jogando a sorte fora. O Airton te recomenda tanto…”
– É Zezé, mas eu tenho um compromisso!
Nessa altura, eu tava num hotel na Rua Paysandu, onde o Fluminense concentrava os jogadores, morava ali. Ele falou:
– Você tá aborrecido porque você tá acostumado a morar em família na sua casa? Vem morar comigo!
Ele me ofereceu pra morar. Ele tinha o filho que era jogador, o Wilson Moreira, jogou no Fluminense, Vasco, Botafogo. Eu falei:
– É porque eu já recebi um dinheiro, eu to devendo lá e preciso pagar minhas contas.
Ele insistiu, insistiu… Eu só via o Tupi no meu caminho, magoado com a injustiça que fizeram comigo. “É… Vai então!”
Ele falou comigo:
– Lá você vai ser campeão. Você vai desfilar em carro aberto, vai se consagrar. Vai morrer lá!
Sabe quem é que foi pro lugar que eu estava ocupando? Telê Santana… Talvez eu fosse o Telê, não sei.
Fico no Olympic final de 56 montando time para 57, trabalhando muito, mas indo e voltando todo dia para Barbacena. E o Olympic continuou mal, eu não consegui arrumar o time. Até que eu resolvi mudar para Barbacena.
FLÁVIO: Solteiro ainda?
MAGELA: Casado. Já tinha uma filha, Vânia. Aí mudo pra Barbacena resolvi dispensar um monte de jogador de fora e subi com a garotada do aspirante. E vamos fazer um jogo amistoso contra o Atlético Mineiro. Renda para campanha dos desabrigados lá do frio. Sofri uma campanha violenta da igreja católica, porque isso era promoção de um centro espírita e o Padre Pároco lá da igreja de onde eu morava lá na Rua da boa Morte me criticava muito. Eu lembro que a imprensa, Barbosa da Silva veio me visitar. E o Padre me excomungou porque eu ia jogar com o Atlético, porque eu estava fazendo campanha em benefício de uma campanha espírita.
Eu só respondi o seguinte:
– Excomunhão de padre é bênção de Deus!
Ganhamos do Atlético 2 a 0 e fomos campeões do segundo turno. Campeão do segundo turno e agora? Olha o Tupi na minha frente! A minha vingança. Agora tá na minha hora!
O primeiro jogo… Emocionante!
FLÁVIO: Quanto foi?
MAGELA: 1 a 1! Lá no Estádio Santa Tereza em Barbacena. E eu concluí que aquele empate foi muito ruim. Eu tinha que ganhar o segundo jogo em Juiz de Fora. Porque o terceiro seria aqui também, de qualquer forma teria o terceiro porque houve empate no primeiro. Naquela época não eram 3 pontos que ganhava, ganhava 2. Cada um ganhou 1 ponto, o que ganhasse o segundo ia a 3 e jogava por empate ou pelo saldo de gols no terceiro. Trabalhei igual a um animal a semana inteira. Armando, pensando como é que o Tupi jogava, como é que eu ia armar taticamente.
Venho pra Juiz de Fora no dia Jogo. Não tinha negócio de chegar na véspera, ficar em hotel vivendo nababescamente não, ia no dia do jogo. Sabe como é que traziam? Eram os diretores que traziam de carro, não vinha tudo num ônibus só não. Fomos almoçar numa churrascaria lá na Rua Bernardo Mascarenhas, churrascaria do Zé Weiss lá. Comemos churrasco, e eu o coração tremia batia descompassadamente… Esse é o meu momento! E eu tinha sido mandado embora do Tupi e o diretor estava lá. Tudo tem seu tempo… vem o jogo.
Fiquei no vestiário conversando com os jogadores, montei um time… O time já estava montado, mas eu tive que fazer uma substituição e fiz a substituição.Jogava o Branco na ponta esquerda, eu botei porque o branco jogava muito aberto na ponta esquerda. Eu precisava de um ponta esquerda que voltasse pra formar o meio de campo pra obrigar o Jorginho lateral do Tupi a sair e abrir um espaço nas costas dele, pra eu explorar a saída dele. Era ali que eu armei. Veio o jogo.
O Campo do Tupi não cabia mais ninguém, nego trepado nas torres de iluminação. E eu tinha que pegar o Tupi logo de cara, se eu demorasse o Tupi assimilaria nossa tática. 20 minutos de jogo 3 a 0. 3 a 0… 20 minutos! Aí o segundo tempo o time já plantadinho tomamos 1 gol, 3 a 1.
O que aconteceria no terceiro jogo no campo do Sport? Eu dirigi o jogo do Olympic com meia cara na cerca de tanta gente. Eu tenho foto. O Olympic jogou 25 minutos sem goleiro. O Toledinho esse ídolo do Tupi, pulou por cima do Danton que era o goleiro do Olympic e cortou a orelha dele com a trava da chuteira. O Danton saiu de campo, naquela época não podia substituir. O Ênio foi pro gol. Nós estávamos ganhando de 1 a 0. O Ênio foi pro Gol e o Tupi empatou. Acabou o primeiro tempo 1 a 1.
No vestiário eu tive uma terrível desavença com o Danton. Porque eu achei que ele já tinha… Eles tinham colado a orelha dele, botado esparadrapo, arrumado ali e ele não queria voltar. E nós brigamos. Brigamos de sair na mão. Baita de um goleiro, meu amigo até hoje.
O Danton volta. Primeira bola que vai no gol ele segura e ela entra. Ele ainda não estava perfeitamente em condições de voltar. Culpa minha. 2 a 1. Ainda éramos campeões.
E nós vamos pra cima e empatamos o jogo. O Time era muito bom!
E o Juiz arranja um pênalti no finalzinho contra o Olympic, e o Olympic perde de 3 a 2. O Final do jogo era uma tortura. O time do Tupi em cima e o time do Olympic defendendo.
Terminou 3 a 2, o Olympic campeão! Lembro como se fosse agora, o Zé de Barros era repórter da PRB3. Esse Zé de Barros que fazia programa… Foi me entrevistar, mas eu não consegui falar. Eu estava vingado de mim mesmo. Tirei um campeonato deles.
Eu era sócio do Tupi, tinha título de sócio proprietário como tenho até hoje.
Isso foi em Janeiro de 58, relativo ao campeonato de 57. Logo depois vem o carnaval, o Tupi fazia um baile na casa de Itália. Vou com a minha família, minha esposa…
Chego lá: “Não pode entrar não!” (Risada)
– Eu sou sócio! Minha carteirinha está em dia.
– Não! O senhor Tufi não quer que você entre.
– Como é que ele pode? Ele não é dono!
Fui embora, não entrei não. Aquilo foi uma tristeza. Levaram do futebol pro campo da mágoa… Acabou!