MAGELA: O Turunas ensaiava no Largo do Riachuelo. E eu estava aprendendo a dançar com o Jairo. Jairo era uma baiana famosa do carnaval de Juiz de Fora. Outra baiana famosa era o Jorge Schuery. E como a gente frequentava a escola de dança do Jairo… Jairo era um mulato alto, bonito.
FLÁVIO: Ah, então ele tinha escola de dança?
MAGELA: Ele tinha, dele. Ele ensinava a dançar.
FLÁVIO: E onde era essa escola de dança?
MAGELA: Aqui na… Primeiro foi na Marechal Deodoro, parte baixa, lá em cima tinha um salão lá. Depois ele mudou, mais tarde, aqui pra um prédio na Rio Branco, onde tem um posto de gasolina em baixo, na ponte do Ladeira. Ali tem um prédio em cima e ele passou a… E com isso ele acabou nos levando. Ele levava o grupo que fazia parte da dança pra sair na escola. Então a gente saía. Como é que era a fantasia? Uma calça branca, um sapatinho branco, sinônimo de malandragem. Uma camisa listrada, um chapeuzinho de palha, camisa listrada azul e branca do Turunas. Camisa listrada vermelho, azul e branco do Feliz Lembrança. Camisa listrada de verde… Aliás, amarelo e preto do Castelo de Ouro, ia assim…
FLÁVIO: Mas você começou saindo na Turunas?
MAGELA: Comecei como membro foi na Turunas do Riachuelo. Aí, conheci muitos bons compositores, repentistas. Conheci a família do País Soares. Oceano, um grande repentista. José Oceano Soares. Que também foi um grande comentarista esportivo, não só político como esportivo. José Céu Azul Soares, outro repentista também que está em Belo Horizonte. Camarão, Biné… São nomes que dava um tema pra eles, eles iam um dia inteiro falando daquele tema.
FLÁVIO: E aí, no caso, o desfile… Estava rolando o desfile. Tinha um momento que parava e tinha aquele desafio, né?
MAGELA: É, eles iam… Aquele grupinho ali de oito, dez, doze pessoas, no máximo vinte. E aí, desafia os dois disputa o desafio. E esse desafio ficava torcida em volta também, né? Vibrava. Cada uma resposta de um pro outro era uma vibração. Né?
FLÁVIO: E assim, era qualquer assunto, ou, por exemplo, fazia piada com… Repente com política…
MAGELA: Podia piada com político, piada com futebol, piada com tudo. Tudo. Tudo quanto era tipo. Porque tinha uma pessoa indicada pra dar o tema. Então, eles levam “Agora, tal!’, aí “Tal”. E num tinha microfone não. É no gogó. E aí esse carnaval era feito como: era desfilado nas cordas. Não tinha arquibancada. Esticava a corda de ponta até… O primeiro a colocar arquibancada foi o Itamar Franco, na prefeitura. Até então eram cordas. E nessas cordas, as pessoas ficavam ali na medida que a escola passava ele ia entrando, depois voltava um bocadinho e tal. Eu me recordo que dentre os grandes desfiles do carnaval de Juiz de Fora, houve um que arrebentou. Foi “Mascarada Veneziana”, um tema do José Carlos de Lery Guimarães. E a letra, da música, também era do Zé Carlos de Lery Guimarães. E a música era do… Num posso falhar… Nelson Silva. Os dois. Feliz Lembrança ensaiava na Rua Halfeld, lá em baixo, antes da ponte da Rua Halfeld, ali tinha um galpão. Ali era depósito de açúcar União. E como ele tinha uma parte desativada, o Feliz Lembrança ensaiou ali. Foi a primeira vez que Juiz de Fora viu uma alegoria feita com arte. Uma gôndola de prata. Lindo. Empurrado como se fosse uma alegoria. O samba, que foi de autoria dos dois, foi antológico. Praticamente a primeira vez que tivemos uma competição em que, literalmente, toda escola participou.
MAGELA: Mas eu acabava futricando em tudo. Eu assistia, já ajuda. Cola alguma coisinha aqui, e ajudava. Ala das baianas, ajudava. E eu ajudei também num outro grande… Nessa da Feliz Lembrança eu não ajudei. Nessa da Feliz Lembrança tem um nome… Eu já falei de dois nomes aqui. Mas tem um nome que não pode ficar esquecido, chama-se Álvaro dos Santos. Tio do José Eduardo Araújo, político que foi ainda, recentemente, prefeito de Juiz de Fora. O Álvaro dos Santos bancou mas muito. Era uma paixão dele a Feliz Lembrança. Outro grande desfile também que Juiz de Fora assistiu, e desse eu participei, não desfilando, mas até ajudando na confecção de peças. Foi a Juventude Imperial. O Davi Chaves veio do Rio de Janeiro pra Juiz de Fora e criou um bloco lá na Vila Furtado de Menezes. Aquele bloco, mais tarde, transformou-se na escola de samba Juventude Imperial. E uma boa parte da sociedade foi pra Juventude. Um dos grandes poetas de Juiz de Fora, o Roberto Medeiros, acabou sendo cooptado e foi pra Juventude. E ele fez um tema: “Zumbi, rei negro dos Palmares”. Outra fantástica apresentação de uma escola de samba. Acho muito difícil hoje uma escola se apresentar com tanto garbo, com tanta competência como a Juventude e a Turunas. Né? Turunas da Mascarada Veneziana e a Juventude de “Zumbi, rei negro dos Palmares”. E assim foi, acompanhando. Mais tarde, eu me envolvi como comentarista. Fui me meter a ser comentarista. Porque eu passei a entender de carnaval. Eu passei a saber tudo. Tudo. Ajudava nas confecções de alegorias…
FLÁVIO: A compor sambas você nunca se interessou não?
MAGELA: Não. Nunca fui competente pra compor um samba.
FLÁVIO: Mas você escreve tão bem, podia ter arriscado.
MAGELA: Não, eu escrevi, mas eu não pus meu nome. Pra escola de samba Castelo de Ouro. “Sonho do Rei Momo numa noite de Carnaval”. Isso eu escrevi. Botei meu no nome dos diretores da escola. Porque eu como comentarista esportivo, não podia estar tendo… Então eu passei isso. Mas tinha vontade de escrever pra uma escola de samba: “Os grandes amores da eternidade”. Isso eu tinha vontade. Orlando e Leonor, Romeu e Julieta, Arlequim e Pierrô… Todas essas, né? Sansão e Dalila…
FLÁVIO: Então, você é um romântico, Magela.
MAGELA: Hein?
FLÁVIO: Você é um romântico?
MAGELA: Num sei…
FLÁVIO: Tá, Magela. Eu acho que sim, hein? Hehehe…
MAGELA: Esse é o meu… Era o meu vontade. Tinha vontade de escrever. Num sei se eu ainda vou escrever.